31 de dezembro de 2012

2012 | 2013

Este é o último post de 2012.
Neste ano consegui dar conta de um projeto com o qual eu sonho há muito tempo. O Trovas de Vinil foi mais do que um sonho que tornei realidade: foi uma terapia e tanto!
Que em 2013 possamos estar juntos através de outras crônicas musicais que estão por vir. Que novas ideias possam aparecer com muita saúde, paz, harmonia e muita música!
Muito obrigado a todos que leram, comentaram e divulgaram o Blog nas redes sociais. Cada participação de vocês fez muita diferença.
E como não sei me expressar sem fazer nenhuma referência a música que rege os nossos corações, que Clara Nunes dê o tom do ano que está por vir!
Beijos e Abraços,
Vinil

TROVA # 16


O ANO DE PATTI SMITH

Patti Smith

          I don't fuck much with the past but I fuck plenty with the future.
― Patti Smith


O ano de 2012 foi um ano e tanto para a música no planeta. Alguns artistas saíram de cena, uns retornaram aos holofotes, outros nos abandonaram para sempre. No entanto, ela retornou ao mainstream com uma bela novidade para os terráqueos destas bandas azuis. Refiro-me à Patti Smith, musa-mor do movimento Punk, artista com “A” maiúsculo e poetisa de grande quilate.  

Nenhuma pessoa do mundo artístico conseguiu fazer o ano de 2012 com tanto brilho como D. Patricia Lee Smith o fez. Em junho de 2012, Patti lançou Banga, seu 11.º álbum, depois de cinco anos sem lançar um novo disco e de oito sem disponibilizar nenhum material inédito. Além disto, um DVD com sua apresentação no Montreux Jazz Festival em 2005 foi lançado co toda a pompa e circunstância. Para a felicidade dos amantes da poesia, vários livros de sua obra poética foram elegantemente reeditada graças ao sucesso de Just Kids (Só Garotos, em português), seu livro de memórias ao lado do fotógrafo e artista plástico Robert Mapplethorpe.


Sobre a capa de seu antológico álbum de estreia, Horses (1975):
         
“Nunca houve dúvida de que Robert faria meu retrato para a capa de Horses, minha espada sonora embainhada por uma imagem de Robert. Eu não fazia ideia de como ficaria, apenas que deveria ser verdadeira. A única coisa que prometi a Robert foi que eu usaria uma camisa branca sem nenhuma mancha.

(...)

          Robert queria fotografar no espaço de Sam Wagstaff, porque a cobertura no número 1 da Fifth Avenue era banhada de luz natural. A janela do canto fazia uma sombra que criava um triângulo de luz, e Robert queria usá-lo na fotografia.

(...)

A icônica capa de Horses, trabalho de estreia de Patti Smith.
Foto: Robert Mapplethorpe
          Robert veio me buscar. Ele estava preocupado porque o céu estava muito fechado. Terminei de me vestir: calça preta de pregas, meia branca de linho, sapatilhas pretas. Acrescentei minha fita favorita, e Robert limpou os farelos de meu paletó preto.

          Fomos para a rua. (...) De alguma forma o dia estava passando muito depressa. Estava nublado e escuro, e Robert ficava o tempo todo vendo se o sol saía. Até que, no fim da tarde, o céu começou a abrir. Atravessamos a Washington Square com o céu ameaçando fechar de novo. Robert estava preocupado que fôssemos perder a luz, e fomos correndo o resto do caminho até o número 1 da Fifth Avenue.

          A luz já estava esmaecendo. Ele estava sem assistente. Nunca conversávamos sobre o que faríamos, ou como ficaria. Ele faria a foto. Eu seria fotografada.

          Eu tinha a imagem na cabeça. Ele tinha a luz na cabeça. Simplesmente.

          (...)

          Largou o fotômetro. Uma nuvem passou e o triângulo desapareceu. Falou: “Sabe, eu realmente gosto da brancura da camisa. Você pode tirar o paletó?”.

          Joguei o paletó no ombro, tipo Frank Sinatra. Eu era cheia de referências. Ele era cheio de luzes e sombras.

          “Voltou”, ele disse.

          Fez mais algumas fotos.

          “Consegui.”

          “Como você sabe?”

          “Eu simplesmente sei.”

          Ele fez doze fotos naquele dia.

          Em poucos dias me mostrou um contato. “Essa aqui tem a mágica”, ele disse.

          Até hoje quando olho para essa foto, nunca me vejo. Vejo nós dois.”

SMITH, Patti. Só Garotos. Tradução: Alexandre Barbosa de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, pp. 228-230.


          Banga é uma coleção de 13 canções (11 faixas inéditas + + 1 cover emocionante de um sucesso de Neil Young + 1 faixa bônus) que são retratos do pensamento inquieto de Patti Smith. Homenagens a pessoas queridas em meio a uma série de referências literárias, um explorador sagaz, um sonho apocalítptico, uma ode a um povo sofrido, amores que se foram para sempre, dois garotos perdidos no famoso Chelsea Hotel. A mistura de Rock, poesia, atitude, despojamento que Patti faz ao lado de seus fiéis músicos (Lenny Kaye, Tony Shanahan, Jay Dee Daugherty e outros) teve uma boa receptividade da crítica e do público em geral.  

A capa de Banga, o melhor disco lançado em 2012.


          Este é, sem dúvida, um dos trabalhos mais relevantes da obra musical de Patti Smith – ao lado de Easter (1978), Dream of Life (1988), Peace & Noise (1997) e Horses (1975). Graças ao reconhecimento deste disco, Patti teve uma nova oportunidade de ser mais ouvida (e lida) por um público mais jovem. É impressionante a quantidade de jovens que conheceram o legado desta artista graças a Just Kids (o livro) e se encantaram com o novo disco. E são outros os jovens que descobrirão a fúria poética do trabalho de estreia de uma das artistas mais incendiárias da música em todos os tempos.



No entanto, é preciso deixar claro que o responsável pelo ressurgimento de Patti Smith no cenário musical foi Robert Mapplethorpe. A lembrança do amigo e companheiro de andanças nova-iorquinas foi o mergulho inicial que Mrs. Smith fez nas profundezas de sua própria memória e se dedicar ao processo criativo de canções. “This is the girl” é uma bela ode à Amy Winehouse. Já “Maria”, por exemplo, remete à tristeza causada pelo desaparecimento de uma das mais belas estrelas de cinema, Maria Schneider (de O Último Tango em Paris), que Patti conheceu durante sua primeira turnê internacional.

Maria Schneider


No entanto, a faixa-bônus do disco, que recebeu o mesmo nome do incensado livro, conseguiu cumprir com perfeição a tarefa de eternizar Mapplethorpe em versos e sons.  



Patti em foto de Edward Mapplethorpe, irmão mais novo de seu melhor amigo.


      Como mais um ano se acaba e segue rumo às nossas memórias, a tarefa deste momento é propor um brinde à música inteligente, à sabedoria e à rebeldia de Patti Smith, que soube cantar o amor e a liberdade como ninguém soube neste ano chega ao fim. Que em 2013 possamos ter a honra de reencontrar esta grande artista em palcos brasileiros e sentir um pouco desta fúria poética ao vivo!

          Cheers!


Leia um texto sobre Banga, o mais recente trabalho de Patti Smith, no blog Pequenos Clássicos Perdidos:

http://pequenosclassicosperdidos.wordpress.com/2012/08/08/patti-smith-banga-2012/