25 de fevereiro de 2018

TROVA # 147


MESTRE PAULINHO
(DUAS OU TRÊS COISINHAS SOBRE PAULINHO DA VIOLA)



Meu bem, perdoa
Perdoa meu coração pecador
Você sabe que jamais eu viverei
Sem o seu amor
(Paulinho da Viola, 1976)



Aproveitei a época do Carnaval e resolvi continuar ouvindo uma de minhas maiores inspirações musicais, Paulinho da Viola. Um dos maiores estandartes musicais da Portela, Paulinho é autor de letras inesquecíveis e de melodias belíssimas que resultam em sambas inesquecíveis e possui mais de cinquenta anos de indefectível carreira musical.


Paulo César Baptista de Faria pertence a uma família de enorme tradição no samba: filho do violonista César Faria, integrante do lendário grupo de choro Época de Ouro, Paulinho cresceu ouvindo mestres como Pixinguinha e Jacob do Bandolim tocando na sala de sua casa. Apesar do pai ter lhe dado seu primeiro violão, Sr. César não queria que o filho se tornasse músico. No entanto, o jovem Paulinho começou a se interessar por carnaval e organizou um bloco carnavalesco na zona norte do Rio de Janeiro.


Aos 19 anos, o jovem Paulo César era um contador e estudava economia. Foi nesta época que ele teve contato direto com Hermínio Bello de Carvalho, que lhe aconselhou a carreira de músico. Ao ouvir pela primeira vez as gravações de Cartola, Elton Medeiros, Nelson Cavaquinho, Zé Kéti, Carlos Cachaça e outros, o samba lhe fisgou em cheio. Começou a compor sambas em parceria com Hermínio e deu início a uma brilhante trajetória musical.


Meu primeiro contato com Paulinho da Viola se deu graças ao meu avô, Sr. Adhemar, que tinha comprado um dos álbuns mais importantes da obra do mestre, Bebadosamba (1996). Logo depois, o videoclipe de “Ame” era transmitido volta e meia pela MTV Brasil. Por fim, meu pai comprou uma coletânea de mestre portelense e aquele rio de versos e trovas nunca mais saiu dos meus ouvidos.


Minhas memórias com a obra musical de Paulinho da Viola sempre passam pela afetividade e com memórias de pura nostalgia: lembro, por exemplo, que meu avô não gostou muito de Bebadosamba porque achou o disco lento demais – hoje, ao ouvir este álbum, tenho o direito de discordar de meu avô e acho um dos trabalhos de samba mais belos que jamais se produziu nos últimos tempos. Lembro de um aniversário meu em que cantei “Foi um rio que passou em minha vida” no meio de uma roda de samba inesquecível. É graças a Mestre Paulinho e à Clara Nunes que desenvolvi meu amor e minha admiração pela Portela, apesar de ter ido pouquíssimas vezes a Madureira em mais de 37 anos de existência.


No entanto, nem todas as minhas lembranças com o filho do Sr. César são agradáveis. Não por uma questão de desgraça, mas por uma questão de um tédio mortal. Em abril de 2011, conseguimos ingressos para assistir a um show de Paulinho da Viola no SESC Pompeia. Não podia me conter de excitação em poder cantar clássicos como “Argumento”, “Timoneiro”, “Perdoa”, “Na Casa do Vavá” e tantos outros. Quando o show começou, Paulinho comunicou ao público que aquela apresentação seria única e somente de lados B de sua obra. Logo de cara, a decepção tomou conta daquelas cadeiras do SESC. Depois, tentei aceitar o argumento do artista, mesmo sentindo a falta de sons familiares de cavacos, de pandeiros e tamborins acompanhados de versos que eu pudesse cantar junto. Todavia, quem era eu para alterar a ordem dos sambas de uma lenda de nossa música?


Saí daquele show depois de ter dormido em alguns trechos, triste por não poder cantar várias daquelas canções que eu tanto esperava ouvir. Fiquei de mal com Paulinho da Viola por um tempo, mas retomei a ouvi-lo com a mesma devoção. Afinal, não poderia ter um coração leviano e ignorar um dos maiores artistas do planeta. Mas, infelizmente, aquela má impressão permaneceu guardada lá no fundo das gavetas da memória.


Ainda tenho a esperança de que vou fazer as pazes em definitivo com Paulinho da Viola e ir em um de seus shows e poder cantar a fina flor de seu cancioneiro sem jogar um sorriso de ironia sequer. Afinal, a poesia de Paulinho jamais sumirá pela poeira das ruas...




Marisa Monte e Paulinho da Viola