8 de junho de 2015

TROVA # 49

OS PECADOS DOS OUTROS


Nilton Serra, obrigado pelo mote!
"Jesus morreu pelos pecados dos outros, não pelos meus..."
Patti Smith


Sinceramente, não gosto muito da Parada LGBT que toma a Paulista de assalto todo ano. Não sou fã de aglomerações em lugares públicos. Tampouco me sinto atraído por eventos públicos que mais parecem comemorações de Carnaval fora da época. Na décima nona edição do evento que ocorre aqui em São Paulo, não me fiz de rogado e não deixei de expressar o meu mau humor público em relação à parada e fiquei em casa e me preparei para ir ver um show com menos gente.


As polêmicas em relação ao evento são intermináveis: seja em relação à exuberância das travestis, seja no tocante às declarações de alguém ou até em relação aos delitos cometidos durante um dos eventos que mais atrai turistas para a cidade de São Paulo. Os reacionários de plantão sempre aproveitam as suas plataformas discursivas para atacar um movimento que já é extremamente desunido.


No entanto, a décima nona edição da parada do orgulho LGBT nos ofereceu uma imagem para reflexão. Uma transexual apareceu crucificada como Jesus em alusão aos crimes de homofobia cometidos no Brasil. Estatísticas dizem que ocorre uma morte a cada 28 horas. Muitas brutais. E vale ressaltar que os números, infelizmente, tem aumentado. A reação dos radicais religiosos conservadores foi não apenas de orquestrar uma série de calúnias e ofensas ao movimento, como também aproveitaram para disseminar imagens de outros protestos com o intuito de descredenciar ainda mais a legitimidade da luta.



Patti Smith: sabedoria, poesia e contestação
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Diante das reações extremadas e hipócritas em relação à transex que decidiu elevar sua voz de uma maneira muito inteligente, volto a me lembrar de várias manifestações de liberdade e contestação diante dos símbolos religiosos... Patti Smith deve ter chocado (e creio que ainda choca!) o mundo inteiro em 1975 quando disse que "Jesus morreu pelos pecados dos outros, não pelos meus". Madonna beijou um santo negro, colocou cruzes em chamas e dançou freneticamente em frente destas em "Like a Prayer" e deixou a sociedade global em polvorosa. A mesma Madonna apareceu crucificada com direito a uma coroa de espinhos na Confessions Tour e ainda conseguiu deixar mais alguns de queixo caído.



A imagem da crucificação é utilizada a torto e a direito e com fins publicitários, ou seja, religiosamente escusos. E em 2015 uma parte da sociedade brasileira resolve se chocar por causa de uma transexual crucificada? Em tempos de heteronormatividade e homofobia que ignora que o Brasil é um Estado Laico, demonstrar indignação em relação à moça da Parada LGBT é, no mínimo, uma demonstração de retrocesso e burrice. Parafraseio mais uma vez minha amada Patti Smith, se Jesus morreu pelos pecados dos outros que aí se indignam, certamente não foi pelos meus que ele morreu...




E vamos tirar Jesus da cruz, minha gente?