1 de julho de 2016

TROVA # 75

O CASTELO DE NOSSOS SONHOS
(ou buscando a autoestima perdida através de 
Marina Lima e Carlos Drummond de Andrade)





"Meu corpo vai sobreviver
Mesmo estando ferido
E até na hora de morrer
Eu não vou me dar por vencido 
Porque sei que os meus perdões 
Vão estar bem ao lado dos teus

Olhei pro amanhã 
E não gostei do que vi
Sonhos são como deuses
Quando não se acredita neles
Deixam de existir
Jurei por sua alma
Mas... perdi 
Admito que perdi"

(“Admito que Perdi” – Paulinho Moska na voz de Marina Lima, 1995)


Se desejamos que nossos sonhos se transformem em castelos altos, suntuosos e vistosos, é preciso que nossos desejos se convertam em tijolos sólidos e saudáveis. No entanto, o que devemos fazer quando rajadas de chuvas e ventos sempre derrubam o que você construiu?
Sou um aquariano incorrigível. Sonhador, viciado em olhar para a o dia de hoje e querer vislumbrar à frente, sem nostalgias de glórias do passado. O grande problema é que meu ascendente em touro e minha lua em virgem acabam atrapalhando tudo. Perfeccionista e ansioso, sinto desespero quando as coisas não saem do jeito planejado por mim (isso vai desde uma aula preparada e minuciosamente descrita em um plano de aula até as frustrações das mais inevitáveis). 


Já reagi das maneiras mais inusitadas e variadas aos espasmos que a vida nos oferece sem dó, nem piedade: deixar claro que não me importo e que não faço questão de fazer por onde é a minha preferida. Fingir que nada daquilo está acontecendo comigo é outra. Chorar, berrar e espernear de tristeza e desespero é bem menos recorrente hoje em dia. Entrar em estado de apatia absoluta perante tudo e todos é a mais perigosa para mim e quem está ao meu redor: a apatia me leva à depressão, azeitada por uma agressividade e doses altíssimas de sarcasmo e ironia que conseguem corroer até o melhor humor das redondezas... Elis Regina dizia que podia ser mais ardida que pimenta. Eu também! E confessar isso não é algo tão legal assim: é dizer que viver dói e pode fazer doer nos outros. E ser motivo de dor para quem você ama é áspero, é duro, muitas vezes é bem cruel.

Marina Lima

O medo tem uma eficiência plena em relação a quem o sente: ele te paralisa. Como diz uma velha canção do Dalto brilhantemente regravada por Marina Lima, ele corre por fora como um maratonista dos mais esforçados, entra por dentro de ti, vai por dentro de você e volta sem sair. E não existe temor maior para mim do que o do fracasso pura e simplesmente. Admitir uma falha e outra até vai, é possível engolir, mas ter a plena percepção de que fracassou?! É duríssimo para alguém que sempre batalhou arduamente para conquistar uma parcela mínima de sucesso no que faz. O jeito é dormir com um barulho desses. Ou tentar achar o som de uma bela sinfonia em meio ao silêncio desesperador quando quase nada de bom acontece na sua vida.
Às vezes eu canso de acreditar na força dos tijolos de meu castelo. Ou dos desejos que são os ingredientes dos meus sonhos. Não, vida: não tente me fazer feliz, afinal o fracasso é algo que dói demais sentir. Admito de peito aberto e coração ferido que perdi feio, vamos partir para o próximo sonho do fundo do coração? Infelizmente a vida, através da depressão (esta agente boa e má) me esfrega na cara de que desistir de seus sonhos seria a maior de todas as frustrações que poderíamos vir a ter, apesar de meu coração estar cansado de sofrer e de amar até o fim...


Carlos Drummond de Andrade


Ao atingir o fundo do poço e sair dele para encarar a vida lá fora, é preciso ativar nossos olhos como um grande farol a mirar os olhos da vida e suas inesperadas e constantes armadilhas. Se é fácil juntar os caquinhos do mundo que sempre está quebrado? Não, não é fácil mesmo. It ain't easy, baby. Mas já que preciso de mundo e de sonhos para chamarem de Meus, o jeito é levantar a cabeça e procurar uma nova trilha para buscar os tijolos que se adaptem melhor ao nosso castelo dos sonhos. Saio pelo mundo como o elefante do belíssimo poema de Drummond: caminhando sem muitos recursos e com muito amor no coração em um mundo cada vez mais descrente de tudo. Ao final de um dia comum - cuja missão é sempre de aniquilar os sonhos de cada um em troca do mero vil metal -, tudo o que nos resta é permitir que a matéria de nossos desejos se desmanche em pleno tapete da sala de estar, expondo a nossa imensa fragilidade. Assim, podemos recomeçar no dia seguinte e sair em busca da velha utopia do castelo suntuoso de nossos sonhos mais valiosos.