12 de outubro de 2017

DISCOS DE VINIL # 44

SECOS & MOLHADOS – SECOS & MOLHADOS (1974)


Nos primeiros meses de 1974, a maior sensação musical do Brasil se resumia a um nome: o grupo Secos & Molhados. Graças a um disco de estreia extraordinário, apresentações ao vivo empolgantes e uma necessidade de muitos brasileiros em ouvir uma expressão de liberdade em meio à repressão política e moral imposta pela ditadura militar, Gerson Conrad, João Ricardo e Ney Matogrosso se tornaram extremamente populares em todo o país.


Em janeiro de 1974, o Secos & Molhados retornava de maneira triunfal a um dos palcos mais emblemáticos da história da música brasileira: o Teatro Thereza Rachel, o mesmo local no qual Gal Costa realizara um de seus espetáculos mais inesquecíveis em toda a sua carreira – FaTal: Gal a Todo Vapor. O rebuliço em torno de Ney Matogrosso era tão grande naquela época que havia uma censora que o acompanhava desde a sua chegada ao local até o fim de cada apresentação.

Ney Matogrosso, João Ricardo e Gerson Conrad

No entanto, nenhum evento foi tão marcante para a trajetória do Secos & Molhados do que o dia 23 de fevereiro de 1974. Até aquele momento, nenhuma atração musical nacional (salvo os Festivais da Canção) tinha conseguido lotar o Ginásio do Maracanãzinho. A popularidade do S&M era tão expressiva que lotou a capacidade do local e ainda deixou milhares de fãs desesperados do lado de fora.

O Secos & Molhados no Ginásio do Maracanãzinho - 23/02/1974

Logo depois a lendária apresentação do Maracanãzinho, o Secos & Molhados embarcou em sua primeira turnê internacional. Pouco antes de embarcarem para o México, o empresário Moracy do Val foi destituído de suas funções sob alegação de supostos desvios de documentação – João Apolinário, poeta, crítico de teatro e pai de João Ricardo, foi convocado para empresariar o grupo. Ao retornarem da América do Norte, Gerson, João e Ney entrariam em estúdio para gravarem o trabalho que sucederia o seu extraordinário disco de estreia.

João Ricardo durante as gravações do disco, em 1974.

João Ricardo, idealizador e produtor do primeiro álbum do Secos & Molhados, não apenas assumiu a produção do segundo disco, com também é o responsável por 12 das 13 canções que foram gravadas. Os problemas com a censura fizeram com que Gerson Conrad e Paulinho Mendonça compusessem “Delírio...” já no final das gravações do disco, visto que “Tem Gente com Fome” e “Balada” (canção de João baseada em um poema musicado de Carlos Drummond de Andrade).

Moracy do Val entre os integrantes do Secos & Molhados

O segundo LP do Secos & Molhados – cuja imagem (as faces de Gerson Conrad, João Ricardo e Ney Matogrosso se sobressaem em um fundo negro) é de autoria de Antônio Carlos Morare, o mesmo que fotografou os integrantes para a capa do primeiro disco – não possui a mesma aura lúdica, anárquica e a magia de fadas e pirilampos de seu antecessor. Pelo contrário: várias canções refletem a mentalidade de sombras e trevas que os membros do grupo viviam em meados de 1974. Apesar da atmosfera negativa que envolvia a produção do álbum, “Flores Astrais”, “Voo”, “Tercer Mundo” e “O Hierofante” são as faixas mais marcantes deste trabalho.


A gravadora Continental chegou a montar uma estratégia de marketing fenomenal para promover o segundo LP do Secos & Molhados: anúncios de TV em cinemas de todo o Brasil foi uma das ações de promoção planejadas na época. No entanto, foi durante a participação do grupo no programa Fantástico na primeira semana de agosto de 1974 que o Brasil e o resto do mundo souberam que Gerson Conrad, João Ricardo e Ney Matogrosso não trabalhariam mais juntos.


 Os dois videoclipes gravados para a TV Globo são o testemunho de que o Secos & Molhados poderia ter sido se os seus membros não tivessem sucumbido às egotrips e demais conflitos internos. O LP foi lançado na segunda semana de agosto de 1974 com o gosto amargo do fim de uma verdadeira mania nacional que encheu o país de alegria e esperança no auge da Ditadura Militar.



As canções deste disco resistiram com o passar dos tempos. No entanto, o segundo LP do Secos & Molhados ganhou apenas UMA reedição em CD – a da série Dois Momentos, organizada por Charles Gavin, ex-baterista do Titãs, que chegou a remixar os originais de 1974. Apesar da Polysom ter reeditado este LP com toda a pompa e circunstância no início da década de 2010, ainda aguardamos uma reedição deste clássico em CD, com encartes especiais, etc. e tal. Assim, a justiça com a história da carreira fonográfica do Secos & Molhados finalmente terá início...