3 de abril de 2016

TROVA # 67

A FONTE DA JUVENTUDE DOS ROLLING STONES

RON WOOD, MICK JAGGER, CHARLIE WATTS & KEITH RICHARDS ANTES DE TOCAREM PELA PRIMEIRA VEZ EM CUBA - 25/03/2016

I haven’t had the time to plan returning to the scene because I haven’t left it.
(Mick Jagger)

Nem a chuva torrencial de Porto Alegre conseguiu apagar o fogo inesgotável de Mick Jagger...


         Existem maneiras plenamente distintas de programas a serem feitos nos nossos embalos de sábado à noite. Ficar em casa, pedir uma pizza e tomar um guaraná é uma pedida excelente. Sair de casa para ir ao teatro, ao cinema ou a algum show também não deixa de ser uma alternativa e tanto para fugir da mesmice avassaladora imposta pela minha rotina de Professor. As duas opções me interessam de maneiras iguaizinhas. Por outro lado, há uma terceira opção que consegue ser mais atraente do que as duas outras que mencionei: e ela está ligada à minha banda do coração – The Rolling Stones.



         Não é todo sábado à noite que podemos nos embalar ao som de uma das atrações mais longevas do showbiz mundial. Principalmente quando levamos em consideração o fato de que eles não davam as caras em São Paulo há 18 anos! Mick Jagger, Keith Richards, Ron Wood e Charlie Watts são quatro senhores de idade que poderiam estar curtindo o doce sabor da aposentadoria, mas estão na estrada para fazer o que sabem de melhor: Rock ‘n’ Roll. Os Stones foram pioneiros na realização de turnês grandiosas, barulhentas e milionárias desde a época de Tattoo You (1981), álbum tido por muitos críticos e fãs como o último lapso de brilhantismo das pedras rolantes – fato do qual eu discordo veementemente, pois sou fã confesso dos álbuns stonianos lançados entre 1989 e 2005. Além disto, a banda tem outros feitos memoráveis de serem incluídos no currículo: foram uma das primeiras bandas a tocar na China pós-comunismo e foram os primeiros músicos de Rock que tocaram em Cuba após o fim do embargo econômico imposto pelos EUA. Ter a possibilidade de presenciar uma apresentação deles em um estádio na cidade em que você mora é definitivamente um convite irrecusável para vislumbrar ao vivo, cores e altíssimos decibéis canções que fizeram do Rock uma verdadeira obra de arte e não um mero e efêmero objeto de consumo.




O setlist do concerto dos Rolling Stones em Havana, 25/03/2016

         Diante de tudo que foi posto, não seria possível para este fã das pedras rolantes há mais de duas décadas ficar em casa na noite de 27 de Fevereiro de 2016, por exemplo. Depois de presenciar a lendária aparição de Jagger, Richards, Wood, Watts e sua trupe por Copacabana em meus últimos dias como morador do Rio de Janeiro, pensei que aquela seria a última vez que eu veria a lendária banda se apresentar ao vivo diante de meus olhos e ouvidos. Além do fator (óbvio, claríssimo e evidente) da idade avançada dos músicos, não temos o lançamento de álbuns inéditos dos Rolling Stones desde o injustiçadíssimo A Bigger Bang, de 2005. Mick e Keith deixaram de compor juntos para se dedicarem a projetos paralelos, colocarem seus egos gigantescos para o duelo em praça pública e manterem vivo o legado do grupo fundado por eles em 1962. Desde a segunda metade da década de 2000, as turnês tem sido de caráter comemorativo, não estão baseadas em lançamento de material exclusivamente inédito, o que particularmente acho triste, uma verdadeira pena. O que eu mais gostava nas apresentações dos Stones é justamente o fatos mais odiado pelos fãs mais xiitas: como as criações mais recentes da dupla Jagger-Richards de discos malquistos como Steel Wheels (1989), Voodoo Lounge (1994) e Bridges to Babylon (1997) dialogavam com os clássicos do cancioneiro stoniano. Vi como eles fizeram isso quando eles passaram pelo Estádio do Maracanã em janeiro de 1995, pela Praça da Apoteose em abril de 1998 e pela Praia de Copacabana em fevereiro de 2006.




         Minha ida ao Morumbi no sábado do dia 27 de Fevereiro de 2016 tinha dois objetivos básicos e fundamentais: matar as saudades dos músicos que me ensinaram o verdadeiro valor da rebeldia depois de 10 anos e (provavelmente) me despedir deles, pois é provável que a Olé Tour tenha sido a última dos Rolling Stones a passar pelo Brasil. Encontrei gente de todo tipo no Estádio do SPFC naquele dia – desde fãs aguerridos e apaixonados como eu que sabiam todas as letras das canções do setlist a senhores de idade acompanhados de suas esposas, filhos e/ou netos a peruas de 50 e poucos anos a jovens mais preocupados em garantir a sua selfie com o majestoso palco dos Stones ao fundo de seus sorrisos forçados e implorando por popularidade nas redes sociais. Jagger, como o melhor showman da história da música do planeta, não apenas tem a consciência da diversidade do seu público, como também faz questão de cumprimentar a todos na língua local com direito a piadas regionais, a alusões ao mundo futebolístico e uma performance digna de inveja geral e de tirar o fôlego de todos os presentes.



         A receita do sucesso para cada apresentação bem-sucedida de Jagger, Richards e cia: hits da banda são obrigatórios para gerar o interesse dos pagantes, além da inclusão de alguns lados B e raríssimas canções das safras mais recentes. Tudo isso em um cenário grandioso e eloquente, uma iluminação inacreditável e com direito a queimas de fogos para encher os olhos e zunir os ouvidos de todos os presentes. Esta é a receita dos Rolling Stones para um infalível espetáculo. E digo com conhecimento pleno de causa de que nenhuma atração faz isso melhor do que eles: afinal o corporativismo no Rock ‘n’ Roll surgiu de vez com os ingleses que levaram os embalos da Swinging London para os quatro cantos do planeta!


         A energia que foi emanada do palco montado no Estádio do Morumbi na última noite de sábado de fevereiro de 2016 era incomum. O que muitos (ou todos) se perguntam é como Mick Jagger e Keith Richards com 72 anos de idade, Charlie Watts no alto de seus 74 e Ron Wood com 69 conseguem subir em um palco com tanta disposição para gastar. Arrisco dizer que a fonte da eterna juventude dos ingleses se encontra em cada riff, em cada acorde, em cada batida ou em cada rebolado que vemos e ouvimos toda vez em que as luzes dos refletores se acendem e ouvimos os primeiros acordes de “Start Me Up” ou “Jumpin’ Jack Flash”. Keith afirmou recentemente que não consegue imaginar a possibilidade de ter exercido outra atividade profissional além da música. Tocar para milhares de pessoas com todo o prazer possível é a atitude mais audaciosa do mundo para fugir da mortalidade imposta a todos nós, seres humanos, cientes de que, em um determinado dia, nossa existência se findará. Os quatro Stones remanescentes rolam com maestria, classe e precisão contra a morte e nos servem como inspiração para celebrarmos a vida através de versos e sons.


KEITH RICHARDS, um homem dos palcos



         Do alto do meu eterno egoísmo de fã, pergunto-me se aquela noite de fevereiro foi a ultima vez em que eu presenciei os Rolling Stones tocaram ao vivo diante de meus olhos e ouvidos. A lógica natural nos leva a crer que sim. As leis contraditórias do Rock ‘n’ Roll que pregam a juventude vampiresca e permanente de suas estrelas nos indicam surpreendentemente que não. Em meio ao eterno embate entre a razão e a emoção, ficamos com a segunda alternativa: afinal de contas, sempre temos a crença permanente de que a jovialidade supostamente perene das pedras rolantes faça com que nós, meros mortais, jamais criemos limo...