A MÁGICA MTV BRASIL
“Every little thing she does is magic
Everything she do she turns me on
Even though my life before was tragic
Now I know my love for her goes on …”
(Sting,
à frente do The Police – 1981)
No início da década de 1990, briguei
com unhas e dentes pelo que Sting, em férias do The Police, pedia no início do
famoso hit do Dire Straits: “I want
my MTV!”. A partir de outubro de 2013, serei mais um dentre vários órfãos da
MTV Brasil. A Music Television brasileira foi mais do que um mero canal de TV
ou puro entretenimento para este que vos escreve. Ela teve um papel decisivo na
minha educação musical e na minha formação cultural. Graças a ela, tive a
oportunidade de fugir do marasmo medíocre e fatal da TV aberta e ter a
oportunidade de ver os integrantes do Olimpo musical nacional e internacional
em plena atividade.
Por outro lado, é também preciso
deixar a hipocrisia e o saudosismo para trás: a MTV Brasil dos últimos tempos
estava profundamente decadente, cambaleava morbidamente em praça pública, tal
qual um Michael Jackson de This Is It
ou um Elvis Presley com vários quilos acima do peso. Sua programação não tinha
mais o brilhantismo e a inteligência do que víamos nos anos 1990/2000. Os VJs que estavam a cargo da programação
não possuíam o mesmo carisma daqueles que um dia revolucionaram a maneira de se
fazer TV neste país. Além disto, a propagação viral da Internet, das redes sociais e do You Tube fez com que a nossa Music
Television deixasse de ser um celeiro que revelava novos talentos e que
consolidava a imagem e o som dos grandes astros nas retinas e ouvidos do grande
público jovem brasileiro.
Também não podemos nos esquecer da
presença sadia do canal no comportamento dos jovens que a assistiam com
programas e vinhetas de cunho informativo e educativo – as campanhas de combate
à AIDS, as campanhas de conscientização política e a memorável campanha
“Desligue a TV e vá ler um livro!” foram alguns dos pontos marcantes da minha
memória televisiva emetivesca. E quem
não se lembra de programas bárbaros como o Barraco MTV, o Disk MTV, o Top 20
Brasil, o MTV Non Stop, o MTV No Ar, o Supernova, o TVLeeZão, Os Piores Clipes
do Mundo, o Furo MTV, o Pé na Cozinha e as cerimônias do Video Music Brasil? Ou do programa que Thunderbird (entre as suas milhares de idas e vindas) comandou em 2003, no qual DOIS novos VJs foram escolhidos? Meus dedos da mão direita também terão uma enorme dificuldade de esquecer o número "25" no dial do controle remoto...
Não me esqueço do primeiro videoclipe
que assisti quando sintonizava (com muita dificuldade) o canal 24 UHF da TV do
meu antigo quarto: “Every Little Thing She Does Is Magic”, do The Police.
Enquanto Sting, Andy Summers e Stewart Copeland dançavam como três patetas
enlouquecidos, eu tive a oportunidade descobrir que a mágica de cada clipe, de
cada vinheta, de cada VJ estava nas
pequenas coisinhas. Coisinhas estas que me livraram da solidão típica de
qualquer adolescente excêntrico. Não, Xuxa não foi minha babá eletrônica. Sim,
a MTV (parcialmente) me educou e me moldou no decorrer dos meus “anos de
formação”.
Modéstia a parte, posso afirmar sem a
menor vergonha e com muito orgulho que se não fosse pela MTV Brasil eu jamais
teria conhecido os integrantes do The Police (que habitavam minha imaginação
desde a tenra infância) em plena atividade, ou não teria vivido o retorno
triunfal de Madonna ao mundo Pop com
o incensado Ray of Light (1998), os
Rolling Stones convertidos em gigantes e dominando uma Nova York com som e
luxúria no vídeo de “Love Is Strong” (do antológico Voodoo Lounge, de 1994) ou a reaparição do Blondie depois de quase
duas décadas de inatividade com No Exit
(1999). Bandas emblemáticas do BritPop
e dos EUA como Blur, Oasis, Nirvana, Pearl Jam e Red Hot Chilli Peppers teriam
passado incólumes por meus olhos e ouvidos. R.E.M. e 10,000 Maniacs, duas das
referências musicais mais importantes para mim, foram apresentados a mim via
Music Television. Mestres da música brasileira como Caetano Veloso, Rita Lee
(com ou sem Os Mutantes e/ou Roberto de Carvalho), Tom Zé, Itamar Assumpção,
Cazuza, Barão Vermelho, Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Os Paralamas do Sucesso,
Titãs, Gilberto Gil, Marina Lima, Cássia Eller, Gal Costa, Nando Reis, Zélia
Duncan, Pitty, Zeca Baleiro, Planet Hemp, Chico Science, Fernanda Abreu e
tantos outros seriam destituídos de qualquer significado para mim se eu não
tivesse brigado pela minha MTV. Gigantes do Rock
‘n’ Roll como os Beatles (juntos ou solo), Led Zeppelin, Janis Joplin, The
Black Crowes, Bob Dylan, Queen, Deee-Lite, Talking Heads, Radiohead, Metallica,
Bom Jovi, Deep Purple, Black Sabbath (com ou sem Ozzy Osbourne), Garbage, Portishead,
Lou Reed, Iggy Pop, Peter Gabriel, Eric Clapton e tantos outros não teriam
sequer tamanho de um Gulliver sem a presença de seus videoclipes na TV. O mesmo
teria acontecido se artífices do Pop
do porte de Alanis Morissette, kd Lang, Prince, Annie Lennox (à frente ou não
do Eurythmics), Stevie Wonder, Sheryl Crow, Mariah Carey, Human League,
Shakira, Whitney Houston, Janet e/ou Michael Jackson, George Michael, Paula
Cole, Fiona Apple, Jamiroquai, Beyoncé e tantos outros não estivessem na
programação da MTV um dia. O que teria sido de mim sem a elegância de David
Bowie, Bryan Ferry e Natalie Merchant?
Se eu não tivesse tido contato com
estes nomes via MTV Brasil, eu jamais saberia distinguir o luxo do lixo em
matéria de música popular. Em meio a uma era na qual a Internet, os downloads, o Google
e o YouTube não tinham popularidade
ou sequer existiam, a Music Television
brasileira desempenhou um papel cultural fundamental para pessoas que dependiam
das antenas UHF, da TV a cabo e da agilidade do Video Cassette.
Astrid Fontenelle: a cara da MTV Brasil |
Enquanto muitas pessoas do meu
círculo de amizades e contatos profissionais assistiam avidamente as atrações que
agitaram o Rock In Rio 2013, eu preferi ficar na solidão do meu quarto
assistindo o canto do cisne da MTV Brasil desenterrar imagens de arquivo em sessões
de retrospectiva enquanto antigos (ex-)VJs
se revezavam na tarefa de relembrar 23 anos de trajetória televisiva. Ao rever
pessoas como Astrid Fontenelle, Gastão Moreira, Cuca Lazarotto, Luiz
Thunderbird, Sabrina Parlatore, Edgard Piccoli, Soninha Francine, Fábio Massari, Marina Person, João Gordo e Chris Couto no vídeo, foi inevitável sentir um
gosto de decepção e saudade. Decepção
porque a tentativa brasileira de fazer uma MTV à brasileira, no final das
contas, deixou de dar certo. Saudade porque
todos sabemos que, a partir de 01 de Outubro de 2013, a MTV feita no Brasil
passa a ser uma mera sucursal da original norte-americana, para tristeza de
muitos parceiros da minha geração (que viveu o ápice da MTV, no decorrer dos
anos 1990).
Graças às fitas VHS (hoje mofadas, provavelmente!) que foram convertidas em arquivos
do YouTube, podemos assistir a mágica
da MTV Brasil na Internet. Assim,
podemos resgatar um pedaço de um momento marcante daquela programação incomum,
anárquica e (às vezes) bizarra, como também, retomar flashes da nossa própria
juventude sem evitar o saudosismo inútil e a lembrança de uma era memorável da
televisão brasileira que, por forças do destino, atingiu o estágio final do seu
ciclo.
Cheers!
Ah, também tenho saudades da MTV dos anos 90. Fúria Metal e a Cuca. Que dupla. Quanta alegria traziam para mim e meus amigos.
ResponderExcluir