MÊS DO GOSTO E DO DESGOSTO
(amando e odiando o mês de agosto)
Você já tá pra lá
de Marrakesh
Mexe qualquer
coisa dentro, doida
Já qualquer
coisa, doida, dentro mexe
Não se avexe não,
baião de dois
Deixe de manha,
'xe de manha, pois
Sem essa aranha,
sem essa aranha, sem essa aranha!
Nem a sanha
arranha o carro
Nem o sarro
arranha a Espanha
Meça: tamanha!
Meça: tamanha!
Esse papo seu já
tá de manhã!
Berro pelo aterro
Pelo desterro
Berro por seu
berro
Pelo seu erro
Quero que você
ganhe
Que você me
apanhe
Sou o seu bezerro
gritando mamãe!
Esse papo meu tá
qualquer coisa
E você tá pra lá
de Teerã!”
(Caetano Veloso, 1975)
Dizem que o mês de agosto
é o mais interminável de todo ano. Mês do cachorro louco, de início de semestre
em escolas de idiomas (universo do qual eu faço parte há mais de 10 anos), com
ausência de feriados, do retorno às aulas. Temporada de cansaço acumulado, de
angústias rebocadas e de algumas esperanças pelo caminho. 31 dias que,
aparentemente, nunca chegam ao fim.
É no decorrer deste mês
que ilustres leoninos e virginianos comemoram os dias dos seus anos. Caetano
Veloso, Madonna, Elba Ramalho e Ney Matogrosso fazem aniversário em agosto.
Estes quatro artistas sempre estiveram presentes nos meus ouvidos e nos
momentos mais marcantes na existência destas retinas ainda não muito fatigadas.
Em 2017, por outro lado, vieram me lembrar que Carlos Drummond de Andrade,
nosso poeta maior, não está mais entre nós há exatos 30 anos. Há três décadas
que a poesia no Brasil não pode contar com o seu maior poeta para tentar
entender esta enorme contradição chamada "sentimento do mundo". O que
o Poeta de Itabira teria a nos dizer nos dias de hoje?
A partir de agosto deste
ano, descobri que ainda há espaço para desafios na minha vida profissional:
iniciei meus trabalhos como Professor da Rede Pública na Cidade de São Paulo,
depois de 16 anos de vida profissional e de 13 com registro em carteira. Ser um
docente de crianças e adolescentes no ensino público é muito mais do que um
mero professional challenge: é
trabalhar com uma quantidade limitada de recursos com um público extremamente
carente de tudo o que se possa imaginar. É preciso rever expectativas,
revisitar conceitos, deixar outros preconceitos de lado, ter a corrente
sanguínea de uma barata. Lições de ouro já valiosamente aprendidas no oitavo
mês do ano de 2017.
Os noticiários
internacionais nos mostraram que o ódio racial não é apenas uma constante na
Alemanha de Hitler ou na França segregacionista de Le Pen. Li e assistir com
imenso horror as notícias e protestos de ódio racial ocorridos em
Charlottesville, EUA. A ideologia rota e imunda da "supremacia
branca" tão bem defendida (e aplicada por nazistas e fascistas) em pleno
século XXI com o aval do Presidente Trump é um dos maiores sintomas do
retrocesso mundial que o terceiro milênio tem vivenciado nos últimos meses.
Tenho em comum o mesmo desejo que o Cazuza: "eu queria ter uma bomba, um
flirt paralisante qualquer" para poder fazer com que a justiça dos homens
valesse alguma coisa...
Como diria o velho (e
sábio) Caetano Veloso: "uma canção me consola". No nosso caso: várias
canções nos consolam e tive a prova disso em dois shows incríveis que pude
assistir. O primeiro deles, Trinca de Ases, contou com um Valete, a Dama
Sofisticada de nossa música e o Rei Buda Nagô máquina de mil e um ritmos
brasileiros. Gilberto Gil, Nando Reis e Gal Costa fizeram da minha noite de 5
de agosto repleta de som e da doce fúria dos Deuses da Música. Uma master class de ritmo, irmandade
artística e de musicalidade em um país marcado por uma série de excessos.
O segundo show também não
deveu em nada em relação ao anterior. Depois de décadas apurando meus olhos e
ouvidos musicais, tomei coragem para sair em uma noite de sábado chuvosa e feia
como um cão para assistir a uma apresentação ao vivo de Zé Ramalho em Santo
André. Em quase duas horas, Mestre Ramalho cantou a fina flor de seu repertório
para uma multidão de admiradores de seu indefectível trabalho. Enquanto Zé
cantava clássicos como "Avôhai", "Admirável Gado Novo",
"Banquete de Signos" e "Chão de Giz", não deixava de me
perguntar o porquê de nunca ter assistido a um show seu antes. Ainda bem que o
mês de agosto nos trouxe oportunidades musicais de ver a vida com mais
poesia...
Enquanto o mês de agosto
de 2017 não chega ao fim, temos mais 11 dias pela frente. Até lá, teremos que
conviver com mais um dos desmandos do governo golpista que decidiu reduzir em
10 reais o reajuste do salário mínimo e esperar ansiosamente o lançamento de Caravanas,
23º álbum de estúdio de Chico Buarque. Não tenho do que reclamar do oitavo
mês do ano até aqui. Na verdade, tenho muito mais para agradecer. Apesar do mês
que parece nunca ter fim...
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe seu comentário!