7 de outubro de 2016

TROVA # 90

SOB O LUAR DE HAVANA
(ou o amor correspondido dos Rolling Stones por Cuba)


Para Gabi Medelo, com muito amor...

I thought you needed my lovin',
But it's my heart that you stole.
I thought you wanted my money,
But you plundered my soul.
(Mick Jagger & Keith Richards, 1972/2009)

       
         Foi na noite em que vi um concerto inesquecível da Buena Vista Social Club que eu passei a desejar umas férias em Cuba. Não apenas pela história de lutas e repressão que a ilha de Che e Fidel viveram por anos de comunismo, radicalismo político, como também pela beleza “vintage” do lugar, com também pela música belíssima dos cubanos e pela admiração que possuo por toda aquela bela gente. A partir de outubro de 2016, ganhei mais um excelente motivo para querer fazer as malas e conhecer Havana o quanto antes.


         Quando soube que os Rolling Stones iriam encerrar sua gloriosa Olé Tour com um concerto gratuito em Cuba depois de varrer várias cidades da América do Sul com muito Rock ‘n’ Roll não achei apenas algo justo. Tinha a certeza de que seria um evento inédito e extraordinário ou até um pouco mais do que isso: algo revolucionário mesmo. Afinal de contas, o Rock tinha sido banido na terra de Che Guevara desde que o Comunismo subiu ao poder e o embargo imposto pelos EUA e Mick Jagger, Keith Richards, Charlie Watts e Ron Wood foram os primeiros artistas do universo roqueiro a dar expediente por lá após a retomada das relações dos norte-americanos com os cubanos.




         No entanto, uma coisa deve ficar bastante clara: o concerto dos Rolling Stones em Cuba na noite de 25 de março de 2016 não foi mais um mero feito notável para a banda. Foi a realização mais importante para a primeira banda de Rock que tocou na China após a abertura da economia daquele regime, que reuniu cerca de 2 milhões de pessoas na Praia de Copacabana e que sempre bate recordes constantes de bilheteria após o final de cada uma de suas turnês. O fato de estarem na estrada há mais de meio século e de ocuparem o posto mais inalcançável no panteão da música popular dos últimos tempos ao lado dos Beatles é algo insuficiente para Mick Jagger e seus companheiros musicais. Eles sempre descobrem outras barreiras a serem derrubadas através de sua música que está sempre a prova de qualquer sinal de envelhecimento.


         A Ciudad Desportiva de Havana recebeu cerca de 1 milhão e duzentos mil cubanos que estavam ávidos e excitadíssimos para verem os Stones ao vivo. Graças às lentes e à direção eficientíssima de Paul Dugdale, aquela noite de março de 2016 foi registrada no belíssimo documentário Havana Moon, que registrou não apenas os momentos mais emocionantes do concerto, como também nos mostrou a felicidade dos membros da banda em estarem naquele palco. Um esforço cinematográfico que não deve nada ao trabalho notável de cineastas de renome como Martin Scorcese, Jean-Luc Godard, Brett Morgen, Hal Ashby ou Robert Frank, que já fizeram filmes excelentes com os músicos.


         Qual são os verdadeiros trunfos de Paul Dugdale em Havana Moon? Ele consegue transmitir a energia de Jagger, Richards, Watts e Wood no palco nos dando a impressão de que eles estão bem na nossa frente – conquista a qual apenas Martin Scorcese pode ter o poder de se orgulhar. No entanto, ao contrário do diretor de Taxi Driver, Dugdale nos ofertou algo que eu jamais tinha conseguido observar em um documentário sobre os Stones: poder ter a oportunidade de ver o que o acontece por detrás no palco segundos antes do espetáculo começar ou durante as corriqueiras trocas de figurino ao lado da mesa de som da banda, por exemplo. Ver que Mick Jagger e Keith Richards ainda se revelam ansiosos antes de entrar em cena é algo surpreendente e comovente ao mesmo tempo, pois nos dá a oportunidade de ver o quão humanos estes músicos são. Outro fator fascinante do filme é a alegria emocionante dos cubanos presentes em assistir, cantar, chorar e bailar com os longevos ingleses – o amor daquela gente pela música dos Rolling Stones se traduzia em cada lágrima, em cada aplauso, em cada palma que se batia na Ciudad Desportiva de Havana.


         Havana Moon teve uma única exibição nos cinemas dos EUA e do Reino Unido na noite de 23 de setembro de 2016 e passou como um cometa pelas salas do Cinemark na noite de 06 de outubro de 2016. Por se tratar de um evento único, nem hesitei ao correr para o cinema mais próximo do trabalho para testemunhar uma das noites mais inesquecíveis da trajetória dos Rolling Stones. Para meu consolo e de muitos fãs da banda desejosos em ver ou rever o filme, um DVD será lançado em novembro de 2016 para que possamos ter mais imagens de arquivo de uma das bandas mais queridas de toda a história da música.






Por se tratar de um registro belíssimo, o trabalho de Paul Dugdale se torna tão representativo quanto outros documentários já realizados por Martin Scorcese (Shine a Light), Jean-Luc Godard (Sympathy for the Devil), Robert Frank (Cocksucker Blues), Hal Ashby (Let’s Spend the Night Together) e Brett Morgen (Crossfire Hurricane). Não apenas por suas câmeras eficientíssimas, sensíveis e precisas, mas principalmente por desvendar o principal mistério do sucesso dos Rolling Stones após tantas décadas: é o público quem mantém a banda unida; a partir de tamanha admiração, Mick Jagger, Keith Richards, Charlie Watts e Ron Wood conseguem reestabelecer o encantamento dos fãs, como também se mantém como referência absoluta de espetáculos ao vivo. Havana Moon nos mostra o porquê dos Stones serem simplesmente incomparáveis e insubstituíveis enquanto artistas e, por isso, é um documento histórico de suma importância para quem deseja compreender os rumos da história recente da arte e da política dos séculos XX e XXI.

     

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