18 de abril de 2017

TROVA # 120

ANDANÇAS MUSICAIS


Para Caroline Rohan, com amor...

         Lojas de discos sempre foram o meu local preferido no mundo. Se elas são grandes e possuem livros à mancheia, tenho vontade de entrar nelas e não voltar para a vida social nunca mais, afinal eu sempre teria algo de novo para ouvir ou alguma coisa de interessante para ler.
       O século XXI e a Era da Mediocridade infelizmente não conseguem conviver com as lojas de discos. Música se tornou um artigo supérfluo, que basicamente se ouve no rádio do carro ou nos fones de ouvido de celular. Visito as casas das pessoas e não vejo mais as coleções de LPs e CDs impondo suas presenças nas salas de estar, para minha tristeza e decepção. As mídias musicais continuam cada vez mais caras e são embaladas em um digipack vagabundo. As poucas lojas de discos que sobraram se tornaram espaços frequentados por colecionadores e amantes ferrenhos da arte musical como eu, que se satisfazem com tais fetiches encontrados em utopias sonoras.

A lendária Modern Sound, em Copacabana

   As lojas de discos não sobreviveram à chegada do MP3 e ao streaming e muitas tiveram que fechar suas portas. Quase morri de tristeza quando a Modern Sound, a lendária loja da Rua Barata Ribeiro, em Copacabana, fechou. Toda vez que eu ia ao Ilha Plaza Shopping, localizado na Ilha do Governador, no subúrbio carioca onde nasci e me criei, e constatava que uma loja de CDs tinha encerrado suas atividades, sentia pontadas no coração. Não deixei de bradar o meu ódio mortal quando a Neto Discos, localizada no coração da Rua Augusta e onde comprei alguns dos itens mais adorados da minha coleção de discos, deixou de existir para virar um restaurante mexicano.

Um vendedor da antiga Neto Discos, na Rua Augusta


     Ainda bem que existem alguns recantos nos quais ainda podemos exercitar nossa paixão por versos e sons em LPs e CDs: a Augusta velha de guerra, a Galeria do Rock e o sebo Berinjela são pilares de resistência que ainda me fazem feliz tal qual os protagonistas dos filmes Durval Discos (Anna Muylaert) ou de Aquarius (Kleber Mendonça Filho), ao ouvirem um clássico da música (inter)nacional soando truinfal por uma sala.

Marisa Orth & Ary França em Durval Discos (2002), de Anna Muylaert



Sonia Braga em Aquarius (2016), de Kleber Mendonça Filho

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   Eu poderia encher várias linhas com anedotas cômicas, bizarras, vergonhosas e tristes sobre minhas experiências dentro de lojas de discos. Todavia, gostaria de resgatar uma experiência mais recente e que foi bastante especial para mim...

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Carolzinha & Eu - uma amizade de quase vinte anos
     
      Minhas temporadas de férias no Rio de Janeiro sempre são bastante intensas e animadas. Especialmente porque não consigo mais passar mais de sete dias na Cidade Maravilhosa. Por isso, meus encontros com minha amiga Caroline Rohan, que me ama e me aguenta por quase duas décadas de amizade, sempre são hilários e repletos de boas memórias. Nosso último encontro de 2016 foi na nossa Copacabana velha de guerra e de tantas anedotas para contar.


     Carolzinha me levou a um paraíso que todo amante da boa música gostaria de ir na época de Natal: em uma loja de discos na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, no Posto 5. Depois de ter jurado que não gastaria nem um centavo com novas aquisições, entrei em contradição ao ver a vitrine com algo extraordinário: uma cópia do álbum de 1973 de Frank Sinatra em LP muito bem-conservada e por um preço baratinho. Ao ver a capa de Ol’ Blue Eyes is Back com o sorriso reluzente e triunfante da Voz, ignorei por alguns minutos de que ainda nem tenho um tocador de discos de vinil em casa. Fiquei namorando outros LPs e alguns CDs, mas minha paixão por Sinatra falou mais alto do que a razão- além da vitrola que ainda não tenho, estou em uma quebra de braços com a falta de espaço para meus livros e meus discos.


   Depois da farra e de algumas conversas e com o meu Sinatra debaixo dos meus braços, continuamos nossas andanças por Copa, fomos visitar a recém-inaugurada estátua de nosso amado mestre Nelson Rodrigues e paramos em um bar para tomar nossas bebidinhas que os canários não bebem. Antes de ir embora da Zona Sul, pedi a Carol que me levasse para o Beco das Garrafas, um beco na Rua Duvivier onde Elis Regina começou a cantar e fez história. Fiquei encantado ao saber que a tal esquina hoje abriga uma loja de discos com uma seção fabulosa de livros de música.



        O melhor da visita à Bossa Nova & Companhia foi poder conversar com os vendedores da loja, entusiasmados em falar comigo porque Carolzinha fez questão de dizer que o amigo dela era escritor e possui um Blog sobre música. Conversamos sobre as discografias de Ney Matogrosso e Maria Bethânia, contei algumas histórias e ouvi outras deliciosas. Fiquei com vontade não apenas de ter lançado meu livro por lá, como quis ficar por lá para sempre, pois a atmosfera do local é composta de versos e sons da melhor qualidade.



         Saí de Copacabana com a crença de que a vida ainda pode ser leve e doce. Tranquila como uma canção de amor entoada por Frank Sinatra, poética como um samba gravado por Maria Bethânia e intensa como uma interpretação antológica de Elis Regina. Graças a uma amiga adorada e que sempre está disposta a me fazer feliz – naquele dia, eu ganhei de presente um chaveiro de lembrança com os nomes de Tom Jobim e de Vinícius de Moraes, dois dos arautos da música brasileira moderna. Graças a Caroline Rohan, meu amor pela arte musical, livros e lojas de discos anda comigo aonde quer que eu vou: afinal, sempre é bom estar em boa companhia...



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