Crônicas musicais e os discos que fazem a nossa cabeça e o nosso coração...
23 de outubro de 2016
TROVA # 93
O
ROMANCE MUSICAL DE MARISA ORTH
Foto: Vinicius Grosbelli
“Na fama, fica-se louca; no
fracasso, mais ainda”
(Marisa Orth)
Eu era uma criança de nove anos de
idade quando vi Marisa Orth pela primeira vez na TV. Tínhamos retornado ao Rio
de Janeiro depois de um tempo morando em Porto Alegre por causa das obrigações
profissionais de meu pai e assistíamos as novelas das 8 com uma assiduidade
religiosa. Naquela época, Marisa despontava como Nicinha, a namorada esfuziante
e ninfomaníaca de Antônio Fagundes em Rainha
da Sucata, de Silvio de Abreu. Aquele trabalho fez da jovem
atriz uma estrela que brilharia intensamente na TV, nos palcos e em grandes
produções do Cinema Brasileiro.
Marisa Orth na novela Rainha da Sucata, de Silvio de Abreu
Marisa Orth como Maralu Menezes
Outra lembrança, bem remota, de Marisa
era quando ela encarava a cantora e apresentadora de TV Maralu Menezes e estava
à frente da antológica banda Vexame. Também lembro de sua participação como a hostess do primeiro Video Music Brasil, prêmio anual da finada e saudosa MTV Brasil que
premiava os melhores videoclipes brasileiros da safra 1994-1995. Um detalhe
importante: o penteado bufante, o vestido extravagante e o tipo físico da bela
atriz (Marisa é uma mulher bem alta, o que lhe dá um status de uma versão
feminina de Golias em cima de qualquer palco) eram a cara da MTV da primeira metade
da década de 1990 – irreverente, sexy
e sofisticadamente debochada.
Marisa Orth no primeiro Video Music Brasil, da extinta e saudosa MTV Brasil
Marisa Orth como Magda no humorístico Sai de Baixo
Marisa Orth em Doces Poderes, de Lúcia Murat
Marisa Orth em Durval Discos, de Anna Muylaert
O que sempre me chamou a atenção em
relação à Marisa Orth é o fato dela ser distinta de outras atrizes: a inteligência,
a versatilidade na realização de papeis cômicos e dramáticos e a belíssima voz
de mezzo soprano quando abria a boca
para cantar. Jamais iremos nos esquecer da tapada gostosona Magda, que roubava
a cena do humorístico Sai de Baixo e que
era bem diferente da atendente da sorveteria de Durval Discos e da corretora de imóveis mal-humoradíssima de Toma Lá, Dá Cá e de Valéria, a gerente
executiva chorona e deliciosamente amargurada de Odeio Segundas. Gostava muito de suas intervenções durante as
primeiras temporadas do Saia Justa,
programa que dividia com Rita Lee, Fernanda Young e Mônica Waldvogel. Sempre quis
ter assistido uma apresentação da Vexame ou do Show do Gongo só para poder ver
o talento de Marisa em ação diante de poucos metros de distância pelo simples
fato dela ser uma artista que combina inteligência, bom humor, drama, melodrama,
música brega e stand up comedy como pouquíssimos
no meio artístico brasileiro...
Marisa Orth como Rita em Toma Lá, Toma Cá
Marisa Orth como Valéria em Odeio Segundas
Marisa Orth, Fernanda Young, Rita Lee e Mônica Waldvogel na primeiríssima formação do programa Saia Justa
*
As grandes oportunidades sempre
aparecem em nossas vidas do modo mais inesperado e surpreendente. Depois de uma
batalha em vão para comprar ingressos para uma série de shows de Ney Matogrosso
em São Paulo, tínhamos descoberto que o Auditório Ibirapuera receberia uma
apresentação do espetáculo Romance,
Vol. III: Agora Vai!, no qual Marisa cantava clássicos do
cancioneiro romântico nacional e internacional. E com um aditivo: vários
momentos de stand up comedy, dando um
banho tremendo em muitos desses comedians
que se apresentam por aí... O melhor de tudo era a possibilidade de ver Marisa
Orth cantando a pouquíssimos metros de distância, ao contrário da leve
frustação passada quando a vi encarnando a hilária Mortícia Addams no musical A
Família Addams sentado em uma das cadeiras mais afastadas do Teatro Renault.
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
Romance,
Vol. III: Agora Vai! é a continuidade de Romance,
Vol. II
(2009), no qual Marisa Orth canta canções de amor que abordam os
dramas da paixão a partir de seus altos e baixos – ao contrário do que eu e
muitos outros pensavam, Marisa não realizou o Romance,
Vol. I por achar que seria um título excessivamente pretensioso
para um espetáculo, mas que um dia fará o Romance,
Vol. I: Finalmente liberado sem cortes e com alguns arranhões!.
A primeira versão do projeto, que
gerou um CD, tinha versões para “I’m Not in Love” (10cc), “Minha Fama de Mau”
(Roberto & Erasmo Carlos), “Sofre” (Tim Maia), “Demais” (Antônio Carlos Jobim
& Aloysio de Oliveira), “Fruto Proibido” (Rita Lee), dentre outras. Para a
segunda versão do espetáculo, Marisa Orth incluiu outras pérolas do repertório
amoroso que faz a cabeça de todas as tribos como “Transas de Amor (Os Sonhos de
Quem Ama)” (Marina Lima & Antônio Cícero), “Ciúmes de Você” (Luiz Ayrão), “De
Tanto Amor” (Roberto & Erasmo Carlos), além de “I Feel Love”, Aparências”, “Baby
Come Back” e “Fala”, sucessos de Donna Summer, Márcio Greyck, Player e do
lendário grupo Secos & Molhados. Ao setlist
deste trabalho ainda tivemos uma leitura bastante descontraída para “As Dores
do Mundo”, de Hyldon, e a hilária “Insanidade Temporária” (de André Abujamra
& Flávio de Souza – gravada no CD Romance,
Vol. II), no qual podíamos ver o diferencial de uma cantora que
também é uma atriz singular.
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
As facetas do romance são contempladas
com toda a irreverência possível: Marisa Orth ora se comporta como uma mulher
fatal, ora faz as vezes de uma pesquisadora que pretende palestrar sobre
relacionamentos para o público pagante com o intuito de decifrar os mistérios
das relações humanas. O fator complicador dos encontros amorosos seria
justamente o cérebro, este órgão que, segundo Marisa, “trabalha
24h por dia desde o dia que nasce até o dia em que se apaixona”. A hostess do show fala de suas experiências
amorosas, entrevista o público, faz piada com os presentes, faz troça e drama
em cima de suas próprias desgraças amorosas: a quintessência do romance,
impulsionado pelo que há de melhor de brega e chique presente na canção
popular.
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
Marisa Orth em Romance, Vol. III: Agora Vai! - Foto: Mila Maluhy
O que aprendemos depois de duas horas
de espetáculo? O romance musical de Marisa Orth nos ensina que toda relação
amorosa é feita de altos e baixos, de vitórias e derrotas, INs e OUTs. Devemos
chorar quando preciso, evidentemente; porém é preciso aprender a rir das
tragicomédias amorosas que regem a vida privada daqueles que amam. Aprender esta
lição através de uma artista incrível faz com que a nossa vontade de assistir Romance,
Vol. III: Agora Vai! ocorra mais de uma vez. O aprendizado é
garantido. As risadas também. Tudo isso rindo e cantando junto com a bela
estrela a comandar o espetáculo lá de cima do palco ou no meio da plateia...
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