27 de novembro de 2017

TROVA # 142

A MÚSICA, AS MEMÓRIAS E A MAGIA DE BARBRA STREISAND



If you see me in the alley
Looking like I don't belong
You can put me in your greenest valley
I'll still be singing the same old song
(Barbara Keith na voz de Barbra Streisand, 1971)


         Barbra Streisand surgiu para os meus ouvidos quando eu estava entrando na adolescência. Enquanto as pessoas da minha idade piravam no som das bandas descoladas como Nirvana, Red Hot Chilli Peppers ou Pearl Jam, eu me encantava com sucessos como “Guilty”, “Woman in Love” e “The Way We Were”. Achava o primeiro disco que ela gravou com o Barry Gibb dos Bee Gees o verdadeiro máximo e fiquei super feliz quando eu adquiri uma versão comemorativa de 25 anos de Guilty para a minha coleção. Era mais um sinal de que o meu ouvido musical era anormal em comparação às pessoas da minha idade.


         O que me encantava tanto no trabalho de Barbra Streisand? A voz. Seu talento estupendo de atriz lhe fazia uma performer seja de canções dos musicais da Broadway, seja de canções pop contemporâneas. Apesar dela ser odiada pelos daqui de casa e de seu gosto do que os falantes de língua inglesa chamam de corny para o seu repertório mais recente e de seus excessos de Diva, não deixei de comprar seus álbuns. Eu sempre digo para qualquer um que se há mais de três discos de um mesmo artista é porque estamos diante de um fã. Daqui da mesa do escritório, vejo mais de dez CDs e um LP da artista de quem escrevo hoje.


         Devo confessar por aqui que, apesar de gostar bastante dos serviços de streaming, não sou muito afeiçoado ao Netflix. Minha preguiça em acompanhar novelas e séries de TV se tornou uma parte congênita de mim desde que minha rotina tem sido tomada pela minha vida profissional e dos meus estudos. Porém, ao saber que The Music... The Mem’ries... The Magic!, a turnê de 2016-2017 em que Barbra Streisand comemorou 6 décadas de uma carreira de sucesso, aproveitei a solidão de uma noite de quarta-feira e fui conferir o resultado.


Aos 75 anos de idade, Barbra Streisand infelizmente não possui a mesma extensão vocal (os agudos eram uma de suas marcas registradas) de outros tempos. Por outro lado, a teatralidade que ela imprimiu a clássicos como “People” (Bob Merrill & Jule Styne) e “I Didn’t Know What Time It Was” (Rodgers & Hart) ou a canções pop como “Being At War With Each Other” (Carole King), “The Way We Were” (Marvin Hamlisch, Alan & Marilyn Bergman) ou “Evergreen” (parceria bissexta de Streisand com Paul Williams) é simplesmente comovente. Ao contrário de turnês anteriores, onde poderíamos notar a presença de orquestras repletas de cordas e sopros, Barbra é acompanhada por um número restrito e competente de músicos no palco.



Apesar das excelentes interpretações, The Music... The Mem’ries... The Magic! possui momentos, digamos, um tanto over para os não-admiradores de Barbra Streisand: o diálogo entre Barbra e o gerente do restaurante no qual ela pede o seu jantar pareceu fake demais até para este que vos escreve; a homenagem à cadelinha Sammy (companheira fiel da estrela durante as turnês), comovente para os amantes de pets, e suas aparições forçadas no palco deviam ser um desgaste para a pobre criaturinha – os donos de cãezinhos sabem que eles possuem audição extremamente sensível; imaginem o desconforto de milhares de pessoas aplaudindo e berrando por sua dona em plena boca de cena...


No entanto, pouquíssimas mulheres na história da música sabem encantar, entreter e provocar uma plateia como Babs: Madonna, Beyoncé, Adele e muitas outras mulheres que se aventurarem pelo showbiz devem aprender um pouquinho com ela em matéria de como se interpretar uma canção, como se vestir com sensualidade e elegância, como se dirigir ao público contando histórias, piadas e anedotas de cunho político e por aí vai... Dois detalhes a respeito de sua história profissional me deixaram boquiaberto: Barbra tem pavor de palco e só fez apenas cem concertos públicos até hoje. Chega a ser impactante saber que uma das figuras femininas mais longevas do entretenimento mundial não fez um centésimo de apresentações ao vivo do que todas as estrelas da música Pop juntas e mesmo assim tem muito a ensinar a todas elas.



E torço para que Barbra sempre consiga dominar o medo do palco para não apenas ensinar aos seus pares com quantos refletores e notas musicais se fazem um bom espetáculo, como também tenha canções belíssimas para cantar para o mundo por bastante tempo. Afinal de contas, precisamos de belas vozes para que possamos ainda acreditar na beleza de nosso cotidiano. Como a boa nos redime e nos salva dos males do dia-a-dia, a música, as memórias e a magia de Barbra Streisand nos fazem crer em um mundo um pouco melhor. Mesmo que este efeito tenha a duração de apenas duas horas... 


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