SETE
DE SETEMBRO: INDEPENDÊNCIA, NEGLIGÊNCIA OU MORTE?
Vale a pena
amar um país que pouco oferece aos brasileiros?
“O seu
amor
Ame-o e
deixe-o livre para amar
Livre para
amar
Livre para
amar
O seu amor
Ame-o e
deixe-o ir aonde quiser
Ir aonde
quiser
Ir aonde
quiser
O seu amor
Ame-o e
deixe-o brincar
Ame-o e
deixe-o correr
Ame-o e
deixe-o cansar
Ame-o e
deixe-o dormir em paz
O seu amor
Ame-o e
deixe-o ser o que ele é
Ser o que
ele é”
(Gilberto Gil, 1976)
Estamos a
dois anos do bicentenário do dia em que Dom Pedro I decidiu urrar por “Independência
ou Morte” de cima de um burro (e não de um suntuoso cavalo, como sugere a história
oficial). Apesar das celebrações oficiais em torno desse marco histórico, nosso
país jamais pode se autodeclarar como livre ou independente. As mesmas
elites que ditava as regras da economia, da política e de outras amarras há 200
anos AINDA fazem valer a lógica da exclusão no Brasil de hoje.
Antigamente,
a gente assistia às novidades passarem diante de nossos olhos tal qual a
Carolina do Chico Buarque. Hoje em dia, ficamos a par do que acontece pelas
janelas abertas da Internet e dos
meios de comunicação. O que não deve ter mudado muito de dois séculos para cá é
o nível de revolta do povo, que pouco consegue fazer para mudar a sua (eterna?)
condição de explorado e enganado. Enquanto alguns se conformam com atual estado
das coisas, outros ficam indignados, revoltados, descabelados e tem a impressão
de que atravessam um mar de solidão sem tamanho, sem fim.
Porém, é
importante sacramentar a pergunta que não cala de jeito nenhum no ano da graça
de 2020: vale a pena amar um país que pouco oferece aos brasileiros? Parcialmente,
eu diria. E vou apontar alguns breves motivos para isso...
O atual
Governo Federal, eleito na base das fake news
e do ódio que sempre existiu em muitos de nós e que adora propagar pelas redes
sociais o seu “patriotismo” típico dos piores anos da Ditadura Militar, tem se
revelado como um verdadeiro vassalo dos EUA: submisso aos caprichos e
insanidades de Donald Trump, o mandatário que ocupa o posto mais ilustre da República
Federativa do Brasil (cujo nome não cito em público de jeito nenhum) já ofertou
aos yankees uma base militar no
Estado do Maranhão, tem planos de entregar a Amazônia de bandeja para o Tio
Sam, fora as declarações “apaixonadas” ao Presidente norte-americanos. Isso sem
citar detalhadamente todos os desmandos cometidos contra os mais pobres
(Reforma da Previdência, vetos presidenciais que parecem atos institucionais
etc.) e favorecendo os mais ricos.
Outro motivo
gritante para ilustrar a nossa eterna condição de vira-lata é o seguinte: o
Brasil JAMAIS poderá se autodeclarar como “independente” se prosseguir violando
direitos do seu povo. O mundo inteiro sabe que nossos governantes administraram
a nação de forma plenamente irresponsável quando o assunto é a pandemia causada
pelo coronavírus. Na noite de 7 de setembro de 2020, enquanto o Sub-Trump
falava à nação brasileira, contabilizamos mais de 4 milhões de infectados e
mais de 127 mil mortos pela doença. Enquanto isso, milhões de brasileiros
morrem de fome graças à ausência de políticas públicas que apoiem trabalhadores
e pequenos empresários; milhares de estudantes não conseguem sequer estudar
durante o período de isolamento social porque não conseguem ter acesso à Internet. Já a imprensa brasileira (que
teve um papel determinante nas últimas eleições) segue cerceada pelo Governo
Federal e parcialmente impossibilitada de noticiar os escândalos de corrupção
que mencionem a família do Presidente. E, por fim, assistimos a Amazônia e o
Pantanal em chamas, por culpa da imensa irresponsabilidade do Ministério do
Meio Ambiente. Se fossemos governados por patriotas de verdade, jamais viveríamos
situações tão absurdas assim...
A ocasião
do feriado prolongado (a data comemorativa da Independência do Brasil caiu em
uma segunda-feira) nos trouxe uma série sem fim de imagens desoladoras: praias,
bares e restaurantes do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Nordeste lotadas de
banhistas sem sequer termos uma vacina para o vírus; em um evento oficial, o
Presidente da República desfila sem máscaras, sem qualquer tipo de proteção individual
e com uma horda gigantesca de aloprados ao seu redor. A ciência, em nosso país,
é constantemente ignorada e desrespeitada pelas autoridades em prol de um
mercado desumano e de uma moral religiosa nada cristã, relegando a vida de
milhares de pessoas para o segundo plano. Diante de 127 mil pessoas
desaparecidas, temos algum motivo para celebrar?
Por outro
lado, minha descrença em dias melhores no futuro sai um pouco de cena ao
sabermos que temos uma classe artística e intelectual que consegue pensar o
país com muito mais sabedoria e inteligência do que os infelizes que ocupam os
Três Poderes e que estão comprometidos até o último fio de cabelo com os
projetos de direita que sempre agradou as elites brasileiras. Seríamos muito
infelizes sem o legado e o pensamento de lendas brasileiras como Glauber Rocha,
Fernanda Montenegro, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tarsila do
Amaral, Rita Lee, Lima Barreto, Djamila Ribeiro, Silvio Almeida, Antonio
Candido, Silviano Santiago, Clarice Lispector, Teresa Cristina e tantos outros
brasileiros ilustres e anônimos que sempre amaram o nosso país, apesar de
tantos pesares. Graças ao trabalho dessas pessoas, eu me lembro que toda crise,
por maior e pior que ela seja, é passageira e que, cedo ou tarde, teremos
condição de ir às ruas com tranquilidade e com orgulho das coisas boas que
ainda existem por aqui, independente da tendência política de qualquer governo.
7 de
setembro de 2020 não deveria ser lembrado futuramente pelos dizeres “Independência
ou Morte” ou “Ordem e Progresso”, mas por “Negligência e Morte” ou “Desordem e
Retrocesso”. O que me consola diante de tamanho horror é ter a certeza absoluta
de que eu jamais contribuí para isso já que, como diz a canção de Gilberto Gil,
devemos ser livres para ser e amar como quisermos...
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